Anabela Melão
Jurista
Como era de esperar pela complexidade da matéria o acórdão do
Tribunal Constitucional proferido na passada
sexta-feira é uma peça jurídica extensa e que suscita algumas consequências
para o futuro tanto pelos “chumbos” como por outras normas consideradas não
inconstitucionais. O TC considerou inconstitucionais 4 normas da Lei do Orçamento
de Estado. Comecemos pelos “corte” do subsídio de férias, cuja
inconstitucionalidade foi declarada na “violação do princípio da igualdade
proporcional”, entendendo este que “a desigualdade justificada pela diferença
de situações não está imune a um juízo de proporcionalidade e não pode
revelar-se excessiva”. Significa isto que pode haver desigualdade, ou seja, o
princípio até pode ser preterido desde que essa proporcionalidade não seja
excessiva. E o que será, quando será, que a desigualdade deixa de ser excessiva?
Que critérios podem avocar os juízes para medir, com a objectividade possível,
essa excessividade? Na linha do juízo de constitucionalidade emitido em 2011 e
2012, o TC esclarece que “as razões que permitiriam reconhecer a
impossibilidade de o legislador encontrar medidas sucedâneas, num contexto de
urgência de obtenção de resultados… não apresentam o mesmo grau de
convencimento em relação aos períodos orçamentais ulteriores…”, acrescentando que
“o decurso do tempo implica um acréscimo de exigência ao legislador no sentido
de encontrar alternativas que evitem que, com o prolongamento, o tratamento
diferenciado se tome claramente excessivo para quem o suporta…”. E isto
significa rigorosamente o quê? Que estas reduções salariais continuarão a ser ainda
constitucionalmente admissíveis em 2014, e em que medida?
Quanto às consequências do acórdão para
o futuro, a Associação
de Aposentados, Pensionistas e Reformados vai instaurar uma acção
administrativa especial nos tribunais administrativos contra a Caixa Geral de
Aposentações e o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social,
questionando os novos escalões de IRS e a sobretaxa de 3,5% no mesmo imposto, a
par da Contribuição Extraordinária de Solidariedade
aos pensionistas e reformados, com base “na ilegalidade, por violação de norma
contratual e de inconstitucionalidade, por violação dos princípios da igualdade,
confiança e proporcionalidade” das normas do OE/13 que respeitam “aos novos
escalões e sobretaxa de IRS e à CES”. Continua assim a discussão da
caracterização destas medidas como um confisco na esfera jurídico-tributária
sobre uma medida que passou no crivo do TC, sem hipotecar o recurso aos
tribunais para “aferir os efeitos confiscatórios em relação a determinado
contribuinte em concreto”.
Curiosamente, a encenação do
Primeiro-Ministro (já classificada por Ferreira Leite como uma
“dramatização”!), uma vez que o valor que está em causa representa pouco mais de 1% da despesa
pública, não convenceu nem os seus críticos internos, começando estes a
defender que o Executivo devia aproveitar a decisão
do Tribunal Constitucional para mudar de rumo, sugerindo, uns entre dentes
outros explicitamente, que este é o momento de uma concertação mais alargada, o
que envolveria a participação num governo do tipo de coligação (solução que
muitos defendem desde o primeiro minuto pós-eleições), a bem do interesse
nacional.
Como reacção aos “chumbos” do TC, Vitor
Gaspar exara um despacho
das Finanças que paralisa os ministérios, os serviços do sector público
administrativo, da administração central e da segurança social, proibindo-os de
contrair qualquer tipo de nova despesa (exceptuando as de pessoal e as de
custas judiciais), o que Marinho e Pinto não teve pudores em qualificar de “um
acto retaliatório e vingativo".
Ante a paralisação do País e a “sugestão” versus única saída
airosa (permitindo ao Governo manter a legislatura até ao final e poupar o
Presidente a tomar medidas mais enérgicas – coisa de que ninguém o parece achar
capaz – numa fase em que a sua impopularidade atinge limiares negativos nunca
antes vistos) o PS vai-se fazendo ouvir, mais por militantes não-residentes da
estrutura partidária e menos pelo seu “líder”, na recusa de participar numa
coligação nestes moldes, dizendo-o defensor de eleições e disposto a governar o
País. Posição apadrinhada por António José Seguro que se limitou a dizer, como
se de uma birra de Jotinhas se tratasse, "Quem criou o problema que o
resolva!"
E aqui é que a nossa perplexidade dá lugar a um desalento
maior! Como é que alguém que profere afirmações destas se acha capaz de
governar o País! Vamos de mal a pior, entre o Governo completamente perdido e
prestes a anunciar o naufrágio e uma oposição que parece capaz de tudo, menos
de se opor, e muito menos de governar. Não se vê remédio para tanta maleita! O
País está infestado de criançolas, de arruaceiros e de consequentes! Houvesse um
reformatório para politiqueiros e sabíamos exactamente para onde os mandar,
assim vamos aturando as criaturas que se nunca foram bestiais há muito que
passaram a bestas!