Anabela Melão
Jurista
Semana de
santos a marcar o ritmo das festas, entre uma sardinha e um copo de sangria.
E esta
pergunta de marca d’água: afinal suspendem-se a democracia e o sonho europeu?
Afinal que lutas são prioritárias?
A democracia. Manuela Ferreira Leite teve esta ideia, mais ou menos
relevada entre desculpas de avançada idade e mau feitio. E era só por escassos
seis meses! Agora veio Rui Rio seguir-lhe as
pisadas, na versão de castigador. Câmaras endividadas resignadas a comissões
administrativas versus gestão corrente. Mas quem é que ainda acredita que se
vive em democracia? E para que serve tal coisa cada vez mais abstrata e
conceptual? Onde está a democracia? Os seus pilares: igualdade de
oportunidades para todos (de trabalho, de saúde, de segurança social, de
educação e de habitação) acham-se completamente derrogados, preteridos que
foram a pretexto da crise.
Aconteça o que
acontecer – e apesar de tudo o que tem acontecido – «os portugueses já não
estão perante o abismo», disse o Primeiro Ministro. “Sonho” com sabor a prémio
depois de mais um exame da troika, parece. E que outra coisa é esta senão o
abismo? Falências, despedimentos, desemprego, recessão, empobrecimento! Conjuntura
internacional caótica: Grécia, Itália, Espanha. Cegueira? Cinismo? Estratégia?
Franklin D. Roosevelt, proferido num tempo ainda mais difícil do que o
nosso, em 1941. A democracia funda-se em coisas básicas e simples: igualdade de
oportunidades; emprego para os que podem trabalhar; segurança para os que dela
necessitam; fim dos privilégios para poucos; preservação das liberdades para
todos.
O sonho europeu. O sonho
de Jean Monnet está ameaçado ou pode reerguer, qual
fénix, ante a crise? Afinal, ele próprio admitia que “As pessoas só aceitam
mudanças quando são confrontadas com necessidades e só reconhecem necessidades
quando a crise as afeta!". Maior
prova não se podia exigir aos cidadãos europeus qua a atual!
Lutas
prioritárias. A Campanha "Teach me how to
drive so I can protect myself" (ensina-me a conduzir para que eu me possa
proteger) é o último apelo às mulheres sauditas para que conduzam em público no
próximo dia 17 de Junho, por causa da "detenção ilegal" da ativista
Manal al-Sherif que foi “apanhada” a conduzir em público, o que é proibido às
mulheres na Arábia Saudita, sem que haja alguma lei que o condene, mas apenas
porque sim. E a solidariedade com Sahar Gul, 15 anos. Cativa meio ano, às mãos
de familiares do seu marido, com a ignóbil exigência que se prostituísse, adivinhando-se
já uma morosa e difícil recuperação física e psíquica
face aos maus tratos sofridos.
Entretanto, por cá, cerca de 730 mulheres vítimas de violência doméstica são atualmente acompanhadas nas instituições próprias
dos Açores, região do país onde há mais casos de denúncia de violência
doméstica. Sempre imperativa a necessidade de as polícias começarem a ter uma atitude
de não legitimação da violência e de as vitimas perderem o receio e a
“vergonha” aculturada geracionalmente da denúncia.
Democracia suspensa. Europa em causa. Casas que não
são lares.
Venha daí mais uma sardinha e um copo de sangria a ver
se a “coisa” passa!