sábado, dezembro 18, 2010

E assim aconteceu...

Carlos Pinto Coelho


Faleceu, há dias, um grande senhor do jornalismo. Daquele jornalismo cuja escola está a desaparecer e que tinha uma maior proximidade com a preocupação cultural e com o sentido ético da cidadania, mesmo quando as matérias abordadas são da chamada "informação geral". Agora vemos jornalistas a saírem das “escolas superiores de jornalismo”, com muitas “especializações”, para caírem nas redacções a regime de “recibo verde”… A tão célebre “geração dos quinhentos” (500 euros) e que é capaz, por exemplo, de fazer a seguinte pergunta numa entrevista a Baptista-Batsos: “Quando é que o senhor conheceu o Ramalho Ortigão?” É certo que nem todos são assim - há boas excepções, nem todos são autómatos -, mas a actual escola não deixa de ser perdulária...
A escola com a qual mais simpatizamos é a que vem do antes do 25 de Abril (principalmente por parte de jornalistas que não estavam bem sintonizados com o regime) e do pós-25 de Abril, que apesar da opinião de cada um, não aceitaram o enfeudamento partidário ou de qualquer "colectividade". Mas não a actual! Porque a actual não deixa o próprio jornalista pensar. E a imparcialidade não se perde quando o jornalista pensa; perde-se quando o jornalista pensa pelos outros, pela ordem instituída, e quando julga, julgando que está a pensar por si mesmo.
Jornalistas tão diferentes entre si como, por exemplo, José Carlos Vasconcelos, Baptista-Bastos, Manuel António Pina, Maria António Palla, Helena Marques, José Cardoso Pires e Carlos Pinto Coelho são (ou foram) jornalistas por vocação, ou seja da sua própria formação cultural, não só académica mas sobretudo vivencial e das capacidades que lhes são geneticamente natas.
Carlos Pinto Coelho era um desses "animais culturais". A sua morte trouxe algumas "penas", mas a pena maior terá sido a que lhe impuseram nos seus últimos sete anos de vida. E a partir daqui fazemos nossas as palavras de Mário Contumélias no JN produzidas na sua crítica de TV:
"Pena é que continuem veladas as razões que levaram ao cancelamento do "Acontece", no final de Julho de 2003. Como é lamentável que ninguém, na televisão pública, se tenha lembrado de reparar o erro, cometido pela administração de Almerindo Marques. É verdade que o notável comunicador regressara há meses à televisão, para apresentar programas especiais na RTP Memória, canal para o qual preparava uma série de entrevistas. Mas foi um regresso discreto, longe do palco e das condições que o jornalista merecia e, sobretudo, insuficiente para expressar o muito que podia dar ao público de televisão. Embora homenageado na morte, ficou irremediavelmente por cumprir, em vida, o sonho de Carlos Pinto Coelho, de regressar ao pequeno ecrã com o seu "Acontece". Uma pena... "