sábado, maio 19, 2012

Ascendamos. Senhor.



Anabela Melão
Jurista

Ainda é dia de Ascensão de Jesus Cristo quando escrevo este pequeno apontamento.
Corre um ano desde que foi aprovado o programa de ajustamento português acordado com a troika. Para a semana, na terça-feira, a troika faz-nos o favor de começar a quarta avaliação. Preocupações: os níveis de desemprego e a eventual saída da Grécia da Zona Euro.
Somente em 1988 (era Cavaco Silva primeiro-ministro deste paraíso à beira mar plantado) se conseguiu alcançar um número tão baixo de trabalhadores em Portugal. Só a construção e o imobiliário perderam 38 mil postos de trabalho no primeiro trimestre deste ano, cerca de 400 empregos por dia. No final do mês de abril, estavam inscritos nos centros de emprego do continente e regiões autónomas, 655.898 desempregados - mais 113.924 desempregados inscritos do que em abril de 2011 -, representando 83,6% de um total de 784.292 pedidos de emprego. Convertendo isto na linguagem do nosso atual Primeiro-Ministro (porque será que escrevi isto com maiúsculas?!): que extraordinárias oportunidades!
Paira uma “nuvem negra” sobre a União Europeia. Fala-se da saída da Grécia do euro. Falamos de prejuízos de que ordem? Circunscrevendo-nos às duas maiores economias do euro. A França enfrentaria um prejuízo de 66,4 mil milhões de euros. A Alemanha somaria até 89,8 mil milhões de euros. Da fatura não se livra Malta “apenas” 300 milhões de euros (que representam 4,5% do PIB), Estónia assumiria 700 milhões (4,5% do PIB) e Eslováquia a bater os 2,6 mil milhões (3,8% do PIB).
A assistir a tudo isto de plateia, o Governo soma e segue com as exceções/adaptações aos “cortes” da administração pública. A par da TAP Portugal, da SATA, da CGD e do Banco de Portugal, já temos privilégios firmados para vinte e três empresas e institutos públicos, que beneficiam de um regime “a leste” do geral: regras mais abertas e flexíveis no que toca às reduções salariais, quer dos trabalhadores, quer dos gestores (parabéns a estes últimos que tanto contribuíram para o descalabro das contas públicas!) que bem podem ver nisto “prémios de desempenho”! Ele há fenómenos ….
Passos Coelho encontra-se com Hollande, domingo, em Chicago, antes da cimeira da NATO. Agenda: crise europeia. O nosso Primeiro (porque será que continuo a escrever isto com maiúsculas?!) continua escravo do cumprimento das metas de austeridade – a apressada ratificação por Portugal do Tratado europeu foi por si só um “tratado”! – e dos tetos da dívida (agarrado ao teto e sem chão?!), enquanto François Hollande defendeu, na campanha, que o Tratado deve ser renegociado. Parece que na “carta” dirigida a Jean-Marc Ayrault, Passos disse estar convencido de que o empenho conjunto entre os dois países “dará os seus frutos para impulsionar uma nova dinâmica de crescimento, de criação de emprego e de prosperidade na Europa”. O homem de Massamá ao leme! Há nisto uma pinta de provincianismo!
E, voltando à Ascensão, estamos no caminho do céu. “Subiu abrindo o caminho na frente deles” (Mq 2, 13), Cristo. “Vou preparar-vos o lugar” (Jo 14, 2)), disse. E, pela penitência que cumprimos, suspeito que seja um “lugar” de honra. Haja paciência! E fé (não era isto que dizia a Assunção – nome apropriado ao dia – Cristas – também muito apropriado!).
“O orçamento nacional deve ser equilibrado. As dívidas devem ser reduzidas, a arrogância das autoridades deve ser moderada e controlada. Os pagamentos a governos estrangeiros devem ser reduzidos se a nação não quiser ir à falência. As pessoas devem, novamente, aprender a trabalhar, em vez de viver por conta pública.” (Cícero) – é o lembrete que deixo para o nosso primeiro (e agora em minúsculas!).