terça-feira, setembro 11, 2007

Maddie Mccann, Joana e Emanuela Orlandi






Inocentes, negligentes ou dolosos, e ressalvando a presunção de inocência e, em caso de culpa, a eventual diferença de tipos de crime, o certo é que, nesta complexa sociedade de radical diferença de tratamento entre privilegiados e desfavorecidos, e de maior diferença ainda se os primeiros têm relações de influência junto do poder político do Estado (no caso, inglês), há, sem dúvida alguma, uma Justiça para os socialmente mais fortes e outra para os mais desfavorecidos.

No caso Joana, a Polícia é acusada de tortura; terão valido na fase de prova, em Tribunal, procedimentos exclusivos da fase de inquérito; a Justiça quis lavar as mãos do caso ao entregá-lo a uma comissão de jurados (com cidadãos ainda muito jovens).

No caso que está na ordem do dia, os pais contrataram assessores, têm um canal de televisão inglês ao seu dispor – canal ao serviço de altas figuras políticas do Estado inglês –, para além do prologando “benefício da dúvida” (inadmissível em investigação policial, porque em casos criminais todos são inocentes e suspeitos até prova em contrário. O regresso a casa, logo que foram constituídos arguidos, é, sem dúvida, uma fuga à Justiça portuguesa.

Pelas diversas leituras que fizemos na net, o “El Mundo”, jornal diário espanhol, foi o órgão de comunicação social do mundo que melhor terá tratado informativamente o caso, numa excelente peça escrita na semana passada e colocada on-line, ao colocar, sem complexos, todos os cenários possíveis para o desaparecimento e/ou morte da menina. E Barra da Costa continua a ser, a nível de comentadores, a voz mais lúcida e frontal, sem redundâncias verbais ou eufemismos. Não procura ser agradável, ao invés, por exemplo, de Moita Flores, que, de todas as vezes que vai à televisão, desdiz, com falsa subtileza, o que comentou na edição anterior.

Ao falarmos de Joana e de Maddie, vem-nos à memória o desaparecimento de uma adolescente há 24 anos, em Itália, e que acabou por cair no sub-mundo da diplomacia, dos serviços secretos, dos tenebrosos poderes políticos: adolescente, Emanuela Orlandi, filha de um alto funcionário do Vaticano, tinha apenas 15 anos quando desapareceu, tendo sido vista pela última vez durante a aula de Música que costumava frequentar, no dia 22 de Junho de 1983. Segundo a imprensa de investigação da altura, o caso está relacionado com o atentado perpetrado contra João Paulo II. "Por que razão é que a CIA, o Sismi, o Sisde e os restantes serviços secretos italianos nunca revelaram aquilo que sabiam?" – perguntou, um dia, o próprio autor do atentado, Ali Agca.

E, agora, perguntamos nós: por que não se falou mais do assunto? Por que pararam as investigações policiais e jornalísticas? Por que razão o Vaticano esteve sempre calado? Qual a relação da tropilha do cardeal Marcinkus e de Giullio Andreotti com o caso? Como se sabe, o segundo veio a ser condenado, com "isenção de pena prisão" devido à avançada idade e ao estatuto de senador, por pertencer à Mafia e por ter encomendado a morte de um jornalista. Este Andreotti, sobre quem o jornal do Vaticano - "L'Osservatore Romano" - tanto insistia na sua inocência (a lembrar a Diocese do Porto ao tempo de D. Armindo), afinal, acabou por gozar da "ajuda" do seu amigo Henri Kissinger quando este conseguiu infiltrar-se nas "Brigadas Vermelhas" para liquidarem Aldoro Moro... antecessor de Giullio na liderança da DC.

Uma coisa é certa: os pais de Maddie – inocentes, negligentes ou dolosos –, se chegarem a ser acusados, vão remeter este caso para uma espécie de jogo Portugal-Inglaterra; vão gozar da condição imperialista do seu país, velha potência do mundo, país do mais ridículo puritanismo vitoriano, gente letrada mas imbuída de misticismo; país onde, de quando em vez, lá acontecem os crimes mais horrendos.