terça-feira, outubro 24, 2006

Quando a Igreja troca Cristo por Constantino

Há dias, um amigo nosso, morador e presidente de uma junta num concelho vizinho, eleito por partido adversário ao que elegeu o presidente da respectiva câmara municipal, dava-nos a demonstrar o seu desencanto com a maneira como a hierarquia da Igreja convive com o poder – com o poder político dos mais fortes!



O nosso amigo, triste que estava, lamentou-se-nos que o pároco da freguesia, que ainda é muito jovem, usa de grande dualidade de critério nas relações com a junta, privilegiando sempre a câmara municipal e ao seu presidente. E exemplificou: tinha convidado o referido padre para participar na inauguração de uma infra-estrutura da junta de freguesia, evento ao qual não faltaram convidados. Passados 30 minutos da hora prevista para o início da festa, com todas as entidades oficiais ali presentes, o pároco estava a fazer esperar toda a gente, já impaciente com a demora.



O nosso amigo – que, não obstante ser político, é uma jóia de pessoa, do mais puro que há nos homens –, pegou no telemóvel e telefonou ao sacerdote. Depois de repetidas chamadas, com número identificado, chamou, chamou… e o padre não tinha meio de atender. Até que o assunto acabou por irritar o próprio presidente da câmara, mesmo sendo adversário político do nosso amigo. O edil pegou no seu próprio telemóvel, fez a chamada ao pároco, pondo-o em linha com o presidente da junta. O padre, pensando que quem estava a chamar era o presidente da câmara, atendeu o telefonema logo ao primeiro toque e mostrou-se muito efusivo: “Bom dia, como vai ser senhor presidente?...”. O nosso amigo respondeu: “Não é o senhor presidente da câmara que está a falar; aqui fala fulano, presidente da junta. Só quero saber se vem, ou não, benzer as instalações”. O pároco respondeu: “Estou a 30 minutos daí, não posso ir”. O nosso amigo contrapôs: “Não há problema. Falo com os convidados, para esperarem”. E o padre concluiu: “Só que eu não estou disposto a ir; dispenso bem isso. Não conte comigo”.



À parte a cerimónia religiosa em relação a uma obra pública, que o bom princípio da laicidade do Estado dispensa, este é um exemplo como a Igreja Católica, infelizmente, ainda é a Igreja de Constantino, que não consegue descolar-se do poder político.

Não desejamos uma Igreja anti-poder, como se fosse um partido ou sindicato, mas também não querermos a sua acção pastoral trocada por uns camiões de areia. Até porque a Igreja não precisa disso. Os cristãos mais humildes costumam a ser os mais generosos em termos de donativos.